“Negócio intermediado por prefeito no RJ tem lucro de R$ 9 mi em 5 dias
A venda de terreno para instalação de uma fábrica austríaca em Queimados (RJ) rendeu lucro de R$ 9,2 milhões em apenas cinco dias a uma empresa fornecedora do município da Baixada Fluminense. Neste período, o valor da área passou de R$ 2,5 milhões para R$ 11,7 milhões.
Os contatos para a negociação foram intermediados pelo prefeito da cidade, Max Lemos (PMDB).
A companhia austríaca RHI comprou por R$ 11,7 milhões da empresa Jogasus a área de 980 mil m² para instalar fábrica de peças para a indústria siderúrgica, em novembro de 2010.
Cinco dias antes, o mesmo terreno havia sido comprado pela Jogasus -que é uma pequena empresa de construções de Duque de Caxias-por apenas 21% desse valor (…)
O prefeito afirma que a valorização dos preços dos terrenos na região é muito rápida e que a área vale hoje cinco vezes mais do que o valor pago pela empresa austríaca (…)
A primeira venda, para a Jogasus, foi formalizada em 4 de novembro, por R$ 2,5 milhões. Em 9 de novembro, foi feito o repasse à RHI, por R$ 11,7 milhões.
Em abril de 2011, o terreno foi beneficiado pela ampliação do distrito industrial de Queimados, o que concedeu benefício fiscal à empresa, como isenção de IPTU e redução na alíquota de ICMS.
A empresa Jogasus, com sede em Duque de Caxias, passou a ter contratos com a prefeitura de Queimados a partir da gestão de Lemos”.
A matéria cita dois impostos diferentes e diz que a empresa foi beneficiada pela isenção de um (IPTU) e redução na alíquota do outro (ICMS).
Esses dois impostos são cobrados por esferas diferentes de poder. Somente a prefeitura pode cobrar o IPTU, e somente a unidade federativa (os estados e o distrito federal) podem cobrar o ICMS.
Uma das regras simples do direito tributário é que somente quem pode cobrar um imposto é quem pode modificar as regras do jogo em relação à sua cobrança. Por exemplo, somente a prefeitura pode conceder isenção, aumentar ou diminuir a alíquota do IPTU. E somente o estado pode conceder isenção, aumentar ou diminuir a alíquota do ICMS. E faz sentido ser assim. Imagine se você tivesse uma empresa e seu competidor pudesse determinar o valor pelo qual os seus produtos serão vendidos. Criaria muita confusa, não? A mesma coisa acontece no direito tributário: você só pode modificar aquilo que gerará consequências para você. Seria injusto se a prefeitura pudesse modificar as regras de arrecadação de impostos que afetarão o governo federal ou estadual.
Mas isso não quer dizer que as diferentes esferas de poder – federal, estadual e municipal – não possam coordenar seus esforços tributários.
Imagine a seguinte situação: um município pobre de uma região isolada e com auto nível de desemprego está desesperado para atrair novos investimentos. Ele concede isenção de todos os impostos municipais (IPTU, ISS e ITBI). Mas o governo do estado no qual aquele município está localizado resolve dobrar os impostos estaduais, inclusive o ICMS. Ora, para a empresa que queria se instalar naquele município, a isenção concedida pela prefeitura não gera nenhum benefício porque o que ela deixou de pagar à prefeitura agora será pago ao governo estadual. A quantidade de dinheiro saindo do bolso da empresa não mudou, apenas o destinatário do dinheiro é quem mudou. E pior: o município, que estava desesperado para criar empregos e resolveu sacrificar-se é quem mais saiu perdendo: a empresa não só não vai mais se instalar ali, mas também vai deixar de receber os tributos das empresas que já estavam instaladas lá.
O contrário também pode ocorrer. Por exemplo, digamos que o governo federal, para combater o fumo, resolva dobrar o IPI cobrado sobre cigarros, encarecendo o produto final. Esse esforço não geraria nenhum resultado se o governo estadual no qual a fábrica está instalada resolvesse conceder isenção de ICMS às empresas tabagistas instaladas em seu território porque o aumento de preço causado pelo aumento do IPI seria contrabalançado pela queda de preço causada pela diminuição do ICMS.
É por isso que, às vezes, municípios, estados e governo federal coordenam suas políticas tributárias: para evitar que os esforços de um não sejam destruídos pelas decisões do outro.
E aqui está um exemplo de descoordenação de políticas tributárias. Não entre esferas de poder dentro de um país, mas entre países:
“Pilotos temem ter de pagar imposto no GP da Índia
No Japão, o tema principal da reunião que os pilotos fazem em todos os finais de semana de GP teve relação direta com o bolso dos competidores, segundo a Folha apurou.
A corrida em Suzuka aconteceria nesta madrugada.
A três semanas da primeira prova na Índia, eles ainda não receberam garantias de que poderão deixar o país sem pagar o imposto que o governo indiano quer cobrar -1/19 do salário anual” (Folha de S.Paulo, 9/10/11).
A lei indiana estabelece que você paga o imposto de renda equivalente à atividade exercida em território indiano. Ora, se uma das 19 corridas ocorrerão naquele país, 1/19 de sua renda deve ser paga como imposto de renda naquele país. Outros países têm regras diferentes. Alguns, baseiam-se na nacionalidade: não importa onde sua renda foi gerada; se você é nacional daquele país você deve pagar imposto de renda naquele país. Outros, baseiam-se em sua residência ou domicílio: você deve pagar imposto de renda onde você mora, independente se você trabalhou parte do tempo fora daquele país. Alguns olham o local de pagamento (onde você recebeu seu salário?) e outros olham o local do fato gerador (onde você exerceu a atividade que gerou essa renda?). E assim vai, cada país com uma regra diferente. Alguns sequer cobram imposto de renda. É por isso, por exemplo, que a maior parte dos pilotos de Fórmula 1 possuem residência em Mônaco: desde 1869 o principado europeu não cobra imposto de renda de seus moradores. É também por isso que há tantos navios registrados no Panamá: o governo daquele país não cobra impostos sobre os navios lá registrados.